“…todos conhecem a famosa fórmula segundo a qual ‘a religião é o ópio do povo’, isto é, um mecanismo para fazer com que o povo aceite a miséria e o sofrimento sem se revoltar porque acredita que será recompensado na vida futura (cristianismo) ou porque acredita que tais dores são uma punição por erros cometidos numa vida anterior (religiões baseadas na idéia de reencarnação). Aceitando a injustiça social com a esperança da recompensa ou com a resignação do pecador, o homem religioso fica anestesiado como o fumador de ópio, alheio à realidade. No entanto, costuma-se esquecer que, antes de fazer tal afirmação, Marx define a religião como ‘a criação de um espírito num mundo sem espírito’ e ‘consolação num mundo sem consolo’. Se a religião, que é uma forma de ideologia, fosse um ‘reflexo’, ela teria que espelhar de maneira invertida o mundo real. Ora, segundo Marx, a inversão religiosa não ‘reflete’ coisa alguma — sendo criação do espírito em um mundo sem espírito, a religião é produção imaginária de algo que não existe. A inversão consiste em atribuir a essa criação do espírito a origem da realidade, em lugar de compreender que é a miséria real que está produzindo a crença no espírito, numa divindade poderosa que pune e recompensa as ações humanas. A religião, como toda ideologia, é uma atividade da consciência social. A religiosidade consiste em substituir o mundo real (o mundo sem espírito) por um mundo imaginário (o mundo com espírito). Essa substituição do real pelo imaginário é a grande tarefa da ideologia e por isso ela anestesia como o ópio”. —- MARILENA CHAUÍ, “O Que é Ideologia”, pg. 108, ed Brasiliense.
Publicado em: 18/02/10
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
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